O dia 1 de abril jamais seria considerado uma data apropriada para alguém começar uma carreira. Mas foi exatamente no dia da mentira que dei início à minha jornada na profissão.
Tudo começou com meu pai me comunicando que havia lido uma nota no jornal falando sobre um curso de Jornalismo. “Se você quiser, eu te levo lá”… E era claro que eu queria! Afinal, passei o ultimo ano do meu curso de normalista sonhando em me tornar qualquer coisa, menos professora. O “qualquer coisa”, no caso, incluía Sociologia, Psicologia ou Jornalismo, áreas que me atraíam Mas, para meu azar, nenhum destes cursos eram ofertados pela Universidade Federal do Espírito Santo.
Então, lá fui eu, metida na minha melhor minissaia, conhecer a redação do jornal O Diário, na rua Sete de Setembro, reduto de modernidade capixaba em 1969.
Fico imaginando a impressão que causei naquele ambiente masculino e extremamente machista. Aos 17 anos de idade, sem pecado, mas, juro, com juízo, eu não tinha noção do perigo que a decisão que tomaria naquele fatídico dia – “não, minha filha, não é um curso, estamos contratando repórteres, você topa”? – poderia representar dali pra frente.
Claro que eu topei! Talvez por culpa da minha longa cabeleira ruiva e das sardas, que me tornavam – aos olhos da redação- um ser meio incomum, tolinha e vulnerável o suficiente para ser engolida e rapidamente despachada para o “seu lugar”. Lugar de mulher, naqueles tempos sombrios, não era mesmo em uma redação de jornal.
Escolhi brigar por minha posição, e me impor. Afinal, eu tinha referências: a cronista Carmélia M.de Souza e a jornalista Maura Fraga, que trabalhavam em O Diário. Eu bem que poderia ser uma delas. Por que não?
Decidida a me tornar jornalista, resisti bravamente. Sobrevivi ao assédio – naquela época tão natural quanto um bom dia – ao medo e à insegurança. E não tenho arrependimentos. Conquistei muitos amigos entre os colegas de trabalho, amizades que levei comigo ao longo de várias décadas, mesmo quando troquei O Diário por A Gazeta.
A profissão me trouxe muitas alegrias, e, para meu orgulho, um Prêmio Esso de Jornalismo, dividido com vários e queridos colegas.
A única mentira nesta história toda foi a que contei à minha mãe, quando ela me perguntou, naquele 1 de abril, como era o ambiente de trabalho, as pessoas… “Nossa, mãe, é maravilhoso, super tranquilo e seguro”…
Menti por uma boa causa, com certeza!
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